23 de fevereiro de 2012

Coisas que perdemos pelo caminho

Passamos a vida inteira perdendo coisas. Não que a gente não ganhe nada em troca, pelo contrário, as vezes o que vem é até melhor do que aquilo que se foi. Mas isso não diminui os buracos que não podem ser substituídos das coisas indispensáveis que já não estão mais aqui. Perdemos porque precisamos aprender. Nenhuma lição é melhor que a da perda.
Lembro até hoje o dia que perdi um anel na pia de um clube. Eu era bem pequena, tirei pra lavar as mãos e o esqueci lá. Voltei mais tarde para buscar, mas alguém já devia ter encontrado antes de mim. Não quis contar pra ninguém. Eu tinha ganhado aquele anel de uma amiga da minha mãe, muito próxima. Eu não queria mesmo ter perdido.
Lição 1: Quando se deixa uma coisa para trás, pode ser que voltar para buscá-la depois de um tempo não seja o suficiente. Outra pessoa pode já estar com ela.
Perdi um avô, que cheguei a conhecer, embora não lembre muito bem. Tenho uma imagem dele fazendo a barba no banheiro, de chinelo. Disso eu lembro de verdade. Ouço as suas histórias e acho que, se tivéssemos convivido mais, nos daríamos muito bem. Tenho saudade dele quando ouço essas histórias, mas uma saudade diferente, de coisas que eu não tive e que eu não lembro.
Aos cinco anos perdi meu posto de filha única. Tenho certeza de que essa foi a minha melhor perda. Deve ter sido duro, mas confesso que não lembro tão bem da parte difícil. Com essa perda, aprendi muitas coisas importantes. Me arrisco a dizer que aprendi as coisas mais importantes da vida a partir dela. Depois de velha, aos 15 anos, perdi meu posto de ‘menina do papai’ com a chegada de outra irmã. Aos 5 anos, ela perdeu o posto de ‘filha única’. Daqui há um tempo, tenho a impressão de que essas minhas palavras serão as dela.
Lição 2: Nenhuma posição te confere conhecimento, nem poder e muito menos alegrias. Dividir é muito melhor do que somar.
Quando a gente cresce a gente perde a vontade de brincar. A gente perde grande parte da nossa inocência. A gente deixa de acreditar em Papai Noel e Coelhinho. Descobrimos que nossos pais podem ser mais velhos, mas nem sempre são mais fortes e perdemos a imagem de super-heróis que lhes entregamos desde que nascemos. Perdemos nossos brinquedos, perdemos nossa felicidade simples, nosso riso fácil, nossa falta de problemas. Perdemos a vontade de ver desenho, de pintar tudo de cores, de descobrir quem mora no final do arco-íris. Perdemos nossa vontade de entender as coisas e de perguntar o porquê delas, por que também, com o tempo, perdemos demais a paciência.
Lição 3: O maior nem sempre sabe mais. “Às vezes as menores coisas, são responsáveis pelas maiores mudanças”.
Por fim, e para o resto da vida, perdemos nosso precioso tempo. Lendo algo que não é importante, se preocupando com o que não nos diz respeito, tentando solucionar problemas que não tem solução, chorando sem motivo, rindo por bobagem, conversando com alguém que não vale a pena, tentando entender o que não tem explicação, sofrendo antes, sorrindo depois. Perdemos tempo fazendo coisas, ouvindo coisas, tentando coisas. A todo o momento, todos os dias, alguns minutos do nosso precioso tempo são desperdiçados.
E assim será até que teremos perdido todo o nosso tempo.
No fim, espero me dar conta de que consegui aprender com as perdas. Espero ver que construí muito mais do que deixei para trás. Espero entender que os buracos vazios não se preenchem nunca porque precisam ocupar seu próprio espaço, para que a gente lembre o que já teve. E desejo muito entender as perdas, aprender com elas, conviver com sua certeza, e principalmente, estar completamente preparada, para as chegadas que elas proporcionam.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

14 de fevereiro de 2012

Tá tudo certo

Tá tudo certo porque não combinamos. Tá certo porque o que acontecer vai ser bom, o que não acontecer não aconteceu, sem passado, sem futuro. Tá certo porque você não prometeu nada. E eu fingi que não acreditei em nada, então ficou sempre tudo muito certo. Porque não houve pedidos nem perdões, foi como eu nunca tinha vivido e como não sei se um dia posso aprender a viver. Foi bom. Então, de verdade, tá tudo certo. Não me dê explicações sobre seus dias, não me diga onde você estava nem o que você fez. Não guarde seus segredos no bolso, porque eles estão escancarados sobre a mesa e eu insisto em não vê-los. Eu quis assim, então, adivinhe? Por mim, tudo certo. Porque não houve procura, houve encontro. Porque não existiam promessas, mas desejos. Porque não era obrigação, era vontade. Porque poderia acabar a qualquer momento, ou durar para sempre. Estipulamos nossas regras, preparamos o nosso jogo e entramos em campo.

Porque não dá pra viver se escondendo da vida. Não dá pra se envolver sem se emocionar. Não dá pra ficar junto sem trocar carinho. Não dá também pra fingir que não aconteceu.

Então se você não ligou, por mim tudo bem. Porque foi bom e quase me fez bem. Então sinceramente não se culpe, não vou me culpar e vamos terminar como começamos: ficando bem.


Por Manoela Soares (@manunsoares)

1 de fevereiro de 2012

Reencontros

Pois bem, ouvi dizer por aí que preciso escrever textos mais leves, mais felizes, mais calmos. Para mim é bem difícil escrever quando me sinto leve, porque escrever, no meu caso, nada mais é do que uma excelente terapia. Se estou curada, não preciso me tratar. Se estou bem, quase não escrevo. Quase. Hoje estou ótima e vim falar sobre isso. Nessas férias – merecidas férias que tirei não só do trabalho, mas também de várias outras coisas – tive muitos reencontros. Reencontrei amigos, sentimentos, saudades e agora, chegando no final, vejo que reencontrei uma parte de mim que estava esquecida.
Ter amigos é uma das coisas que considero mais especiais na vida. Aprendi isso desde muito cedo e tento cultivar e semear novas amizades todos os dias. Reencontrar amigos é ainda mais especial. Ver que a cabeça e o corpo já não são iguais, que os ideais são discutidos com muito mais maturidade, que as diferenças já não nos atrapalham. Ver que a mudança física é inversamente proporcional a nossa mudança de valores e que nos aproximamos dos nossos amigos mesmo estando longe deles. Ver que sempre temos alguma coisa – que não sabemos – em comum com esses amigos, mesmo sem vê-los, mesmo sem falar com eles todos os dias. Reencontrar um amigo é ter certeza de que os laços emocionais que nos unem a uma pessoa podem ser tão fortes quanto os laços de sangue. E que ter um amigo é ter alguém. É ter alguém sempre. E só isso já justificaria a importância da amizade.
Depois de ficar alguns meses ou cinco anos sem ver alguém você acha que as coisas vão começar a mudar entre vocês. O papo, a cabeça, as semelhanças, os sonhos, a turma, a preferência .. parece que essas coisas todas vão mudar. Não mudam. Mas ao mesmo tempo elas também já não são mais as mesmas, porque elas são quem somos depois de passado todo esse tempo.
Um amigo que eu não via há cinco anos me contou coisas sobre mim que eu mesma já não lembrava. Não que a cabeça seja meu forte – ontem mesmo foi o aniversário desse mesmo amigo e eu só falei com ele hoje – mas ele me apresentou através de histórias uma pessoa que eu não conhecia mais. Alguém que eu já fui. Ele me contou novidades sobre mim. Me contou histórias nas quais quase não pude acreditar, e eu só perguntava “Mas eu fiz isso?” Sim, eu fiz muitas coisas das quais já não me lembrava, coisas que me trouxeram até aqui e me fazem ser quem sou hoje. Ele me contou como fui corajosa, como fui imatura, como fui chorona, como fui mal-criada, como fui bicho-do-mato, como fui engraçada. Ele me contou quem nós fomos juntos. O que fizemos juntos. Do que fomos capazes. Do que não fomos. O que assumimos. O que levamos anos para nos dar conta. Como nos defendemos. Como éramos unidos. Como éramos fortes e fracos ao mesmo tempo.
Reencontrando meus amigos eu reencontrei uma pessoa que eu não era mais. Eu acordei uma parte de mim que dormia desde que fui embora de Porto Alegre deixando lá os muitos – e bons – amigos que fiz durante os dois anos que morei lá.
Reencontrando meus amigos reencontrei em mim sentimentos que estavam anestesiados, mas que ainda moravam aqui. E reencontrando-os, sem querer, me reencontrei.






Quem fomos ...




Quem somos ...



Por Manoela Soares (@manunsoares)