13 de maio de 2011

Deixar de ser

Não sou sempre a mesma. Ás vezes acordo mais pra lá do que pra cá e nem eu mesma sou capaz de me aguentar. Tem dias que não me esforço para demonstrar meu carinho, para dar um beijo, para retribuir um abraço. Ás vezes estou tão cansada de mim mesma e de meus pensamentos que esqueço de dizer a alguém o quanto é especial. Ás vezes meu mau humor é tanto que não sou capaz de sentir que o amor segue aqui, crescendo sempre. Ás vezes sou tão egoísta que não consigo ver alguém tentando me levantar de cada queda, o tempo todo ao meu lado.

Não sou sempre a mesma. Ás vezes me faço criança, me dou direito de sentir medo e ter meu coração quase cuspido do corpo num agito inevitável que insiste em acontecer a noite. Me dou direito de não querer ficar sozinha, de querer dormir com alguém, de precisar de um carinho, de fazer birra pelo que quero, de simplesmente não lutar pelas coisas, de ser incosequente de resultados.

Não sou sempre a mesma. Às vezes acordo chorosa e tenho a certeza de que nada dará certo. E nesses dias, nem mesmo as coisas mais concretas são capazes de sustentar minhas angústias. Tenho vontade de desistir de tudo o que sempre sonhei, do que me fez chegar até aqui, do caminho que ainda pretendo seguir. Assim, sou incapaz de entender os silêncios e a ausência de quem insiste em me deixar a sós comigo mesma.

Não sou sempre a mesma. Ás vezes me acordo escritora e passo e mail para toda a minha lista de contatos. Ressuscito ex amigos dizendo o quanto me fizeram falto, conto as novidades mais velhas para quem já não está por perto, combino coisas para o final de semana, teço uma rede de contatos já esquecidos. Faço a lista do super, dos médicos, da farmácia, das tarefas de hoje. Escrevo poesia para quem não devo, releio antigas cartas amareladas das gavetas. Nesses dias me sinto sonhadora, me sinto bonita, me sinto mais livre, é como se estivesse me dirigindo a um lugar ainda não explorado.

Não sou sempre a mesma. Ás vezes acordo e é outra. É outra no quarto, mexendo nas gavetas sem saber ao certo o lugar das minhas coisas. Ou das dela? É como se eu não fosse mais eu mesma. É como seu eu já tivesse ido embora há muito tempo, naquele dia em que tudo foi esquecido. É como seu eu já não estivesse mais presente, como se já não ocupasse mais aquele lugar na mesa. Como se não pudesse mais abrir aquelas janelas.

Não sou sempre a mesma porque ás vezes me deixo deixar de ser.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

2 comentários:

  1. Realmente, quem nunca deixou de ser si proprio. :\ lindo gorda, lindo!

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  2. é o ciclo da vida, e se todo o dia a gente fosse igual, tivesse os mesmo sonhos, as mesmas angústias e preocupações, talvez essa vida não tivesse tanta graça.. talvez a gente só ame as pessoas porque de fato elas não são todos os dias iguais, só sei que eu te amo exatamente porque as vezes tu te deixa deixar de ser!

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